Descaminhos: A astúcia dos afásicos

terça-feira, dezembro 13, 2005

A astúcia dos afásicos

Há fundamentalmente duas funções que um título exerce: ou bem é um prelúdio, ou bem um contraponto.
O primeiro, instalada uma distância intransponível entre si mesmo e o texto, procura falar de um não-lugar. Sua missão é antecipar o que está por vir quase como se não fizesse parte de todo o espetáculo, como se fosse um olho desavisado de um deus onisciente que, meio que por acaso, tivesse tombado desde sua perspectiva eterna sobre aquele fragmento de pensamento e, até com certa displicência, deixasse escapar para os mortais uma antecipação do que estaria por vir.
O segundo rompe a linearidade e fala de um antes que já deve ser um depois. Seu lugar é o durante. Como o contraponto de uma sonata, abre um jogo com o texto e procura torcer a vista do leitor. Ele sabe que o texto não dá conta daquilo que quer agarrar. Matreiro que é, corre a volta no campo dos sentidos e, de longe, grita para o texto: aquilo que o texto queria agarrar cai numa cilada, fica entre a gritaria do título e do texto e, se não chega a ser dito, é tocado em seu silêncio.
Na verdade, todo título – mesmo o francamente ruim - cumpre sempre as duas missões, ainda que eventualmente de forma precária.
Raro é encontrar o leitor que ouça a gritaria.

3 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Eu ia dar um título ao comentário, mas desisti.

Lembrei agora do tempo em que eu achava que poderia ser fotógrafo. Eu tinha feito uma foto realmente boa, e precisava dar um título a ela. Depois de algum tempo pensando, procurando um prelúdio ou contraponto (sem aconceituação, é claro), dei-me conta de que as pessoas que estavam comigo no laboratório na hora da ampliação a chamavam de "a foto do olho", e eu mesmo achamava assim. Então, "Olho" ficou sendo o título - porque um título é apenas um nome.

Até hoje acho a forma mais honesta de lidar com eles. Espero o texto ou o que seja ficar pronto e vejo como o chamo. Ou melhor, como ele se chama. E então tenho um título.

17 de dez. de 2005, 12:24:00  
Anonymous Anônimo disse...

Bitte, prezado. Um conto de Natal.

24 de dez. de 2005, 12:18:00  
Anonymous Anônimo disse...

não esqueça de dizer tchau...


... só para vc não dizer que eu abandonei o seu blog.

beijos Gabriel!!!!

29 de dez. de 2005, 21:25:00  

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial